Voluntária por amor

Após melhora clínica de amigos diagnosticados com câncer, Carmem Lopes se voluntariou por vinte dias nas Obras Sociais Irmã Dulce. Com 33 anos de atuação no campo do jornalismo, gaúcha relata as experiências em Salvador.

07 • DEZ • 2022
 

Luiz Felipe Bolis – Cidade do Vaticano

Os dias de novembro de 2022 cravaram no coração de Carmem Lopes lembranças, experiências e testemunhos tão gigantescos quanto o Brasil. As vestes da caridade embelezam os 59 anos da gaúcha e espelham na vida da mulher de cabelos ruivos as imagens da ternura, da simplicidade e do amor. Sob o manto da gratidão pelas últimas graças alcançadas, a jornalista aposentada percorreu os caminhos de dentro e do exterior de si mesma para cumprir palavras lançadas à intercessão de Santa Dulce dos Pobres

Fortalecida com a sabedoria e a humildade trazidas da pequena Alegrete/RS e dos braços da mãe Elza, Carmem partiu de Porto Alegre/RS para Salvador/BA, rumo ao voluntariado de três semanas nas Obras Sociais Irmã Dulce. Disposta a voar nas asas do Senhor, ela pôs na mala do espírito a melhora clínica de quatro amigos diagnosticados com câncer e o serviço ao próximo. Sobre o coração, a necessidade sublinhada de seguir apressadamente para as Obras da santa brasileira.

Residindo em Pelotas em 1983 e já atuando na produção de notícias, Carmem viu o seu nome estampado como a primeira repórter a fazer cobertura futebolística na emissora em que atuou, marco inesquecível em 33 anos de profissão. Anos depois, o olhar de semblante carmelita, assistido diariamente por milhares de gaúchos, enxergou o potencial que havia por trás das câmeras, como forma de, desde os bastidores, notar no secreto do cotidiano o surgimento de novos talentos para o mundo da comunicação.

Carmem imprimiu em si mesma o retrato das oportunidades irrecusáveis que surgiram. Marcou história no Rio de Janeiro e em lugares de pouca fama. Voltou para o Rio Grande do Sul muito amado por ela, onde acompanhou ao vivo, e fora do universo de trabalho, as cenas mais belas aos olhos de uma jornalista: a felicidade de uma mãe diante de uma rua calçada; reivindicação de décadas.

A alegretense Elza, amiga fiel de Santo Antônio, faleceu alegre, deixando vivas as esperanças de uma mudança que acontece sob as pupilas dos que creem, testemunhos que a filha guarda a sete chaves no coração. Carmem a enterrou em fevereiro de 2020 e, no mês seguinte, viu o Covid-19 bater às portas do mundo. A pandemia quis levantar sobre ela o grito da solidão e do isolamento, mas, ainda que de longe, Carmem mantinha-se bem próxima aos seus, os enxergava, acolhendo-os com o olhar, vivendo um dia de cada vez sob todos os cuidados possíveis de quem preserva a vida.

Debaixo do tapete de dois anos e meio de incertezas e guerras invisíveis contra o vírus, Carmem viu ainda quatro amigos enfrentarem o combate ao câncer. Foi então que os seus olhos enxergaram os de uma baiana que bateu às portas do seu conhecimento já pela década de 1980, quando ainda caminhavam pelas estradas das palavras e das ações em forma humana. “Visita cada amigo meu, minha Santa Dulce! Entrego cada um aos teus cuidados”. A santa recém-canonizada guardava cada palavra.

O milagre pintou-se sobre as tintas da aquarela do real para Carmem: o progresso positivo no tratamento dos companheiros de profissão diagnosticados com a doença, o sumiço das ameaças, o resultado ao pedido feito à Irmã Dulce, até mesmo o desaparecimento daquele joanete no seu pé que a incomodava nos últimos dias. Quando viu, já estava acolhida pelo novo voluntariado, pelos braços de Salvador e pelos das freiras que a hospedaram em um convento. “O pobre é Deus aos nossos olhos. As Obras Sociais Santa Dulce possuem religiosidade, saúde e educação”, pontua Carmem”.

A Lei nº 9.608/98 da Constituição Federal Brasileira considera serviço voluntário “a atividade não remunerada prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou a instituição privada de fins não lucrativos que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência à pessoa”. Os conhecimentos de Carmem pelos becos da cultura do Brasil relatam a regulamentação do voluntariado em um período no qual pessoas de má índole processavam locais de caridade pelas brechas da difamação. Mas, apesar de tudo, ela sabe que as boas almas de verde e amarelo se sobressaem à porcentagem citada.  

Dados do Anuário Pontífice de 2021 informam que a Igreja Católica mantém 258.706 instituições de educação, saúde, de beneficência e assistência em todos os continentes. Dentre essas, o coração das Obras Sociais Irmã Dulce (OSID) pulsou em Carmem Lopes o desejo de servir, de escrever novas narrativas com as orações da vida e de falar de amor com gestos de humanidade.

A OSID nasceu em 26 de maio de 1959, tendo como fundadora a Santa Dulce dos Pobres, abrigando pobres e doentes recolhidos das ruas de Salvador. Aos olhos da Bahia, do Brasil e do mundo, a admiração é a mesma por um gigantesco hospital que se edificou a partir do que antes era um simples galinheiro.

As dimensões das Obras Sociais Irmã Dulce impressionam Carmem: “tudo lá é muito limpo, organizado e com muito respeito, porque a Irmã Dulce pregava isso: ‘para os meus pobres, sempre o melhor’”. A sede está distribuída por 40 mil metros quadrados e as Obras possuem uma infinidade de núcleos Salvador afora, com trabalhos voltados à Saúde, Assistência Social, Pesquisa Científica, Ensino em Saúde, Educação e à preservação e difusão da história de sua fundadora.

A Capela Santo Antônio, localizada no Complexo e lugar de oração da Santa brasileira, se tornou o “escritório” de Carmem, como ela mesmo cita. Em um de seus trabalhos, cumprimentava cada visitante do Memorial Irmã Dulce e oferecia uma visita guiada pelo lugar. Nos campos de futebol a jornalista deu vez e voz aos seus talentos, enquanto fez brotar um rio de caridade nos campos do coração dos visitantes do Santuário. O que seriam quinze dias de voluntariado se concretizaram em vinte, tamanha foi a receptividade que o lugar a proporcionou.

Carmem lança ao mundo o pedido para que cada um faça um pouco pelas Obras Sociais Irmã Dulce e que esse pouco de muitos se some, contribuindo com as despesas e a manutenção do Complexo. Ela crê que, de tijolo em tijolo, a mobilização humana é capaz de edificar um castelo de possibilidades reais para se garantir a dignidade de um bom tratamento e a assistência a milhares de pessoas que, nas Obras, mensalmente buscam apoio em recursos básicos de sobrevivência, saúde, educação, espiritualidade e outras áreas.

Também conhecida como Complexo Roma, a sede abriga 20 dos 21 núcleos da entidade, incluindo 954 leitos hospitalares para o atendimento de patologias clínicas e cirúrgicas. Desses núcleos, 19 apresentam atuação no campo da Saúde, a exemplo do Hospital Santo Antônio, Centro Geriátrico, Hospital da Criança, Unidade de Alta Complexidade em Oncologia, Centro de Acolhimento à Pessoa com Deficiência e Centro Especializado em Reabilitação e do Centro de Acolhimento e Tratamento de Alcoolistas. Somente no Complexo Roma são contabilizados por ano cerca de 2,2 milhões de procedimentos ambulatoriais. 

Sobre um jardim de vozes ornadas de dor e gratidão, tantas vezes a gaúcha pôs em prática os ensinamentos do Papa Francisco e escutou o relato da verdade com os ouvidos do coração: “esse é o único lugar em que eu venho sabendo que serei atendido”. Carmem registrou vídeos em suas redes sociais, compartilhando com um mundo de seguidores a realidade vista por ela mesma.

Os sentidos do corpo e da alma se unem a sorrisos e lágrimas na face do amor, ao toque do dedo de Deus no agir de crianças, jovens, adultos e idosos. “Eu voltei diferente, porque a água do rio que passou por aqui não é a mesma que passou ontem e não é a mesma que vai passar amanhã. O voluntariado nas Obras Sociais Irmã Dulce está de braços abertos para o mundo”, pontua Carmem.

Entre tantos títulos recebidos pelos degraus da vida, os amigos de Salvador selaram mais um sobre a jornalista aposentada: o de embaixadora. Carmem sente que a sua missão apenas começou. O compromisso consigo mesma, com o próximo, com Santa Dulce e com Deus de propagar a caridade e os direitos do ser humano.

Um Milhão de Amigos para Santa Dulce

 

Com foco dedicado à redução dos déficits financeiros das Obras Sociais Irmã Dulce, cujo valor estimado até o final do ano de 2022 é de R$ 24 milhões negativos (2 milhões/mês), a campanha Um Milhão de Amigos para Santa Dulce busca mobilizar pessoas físicas diante da necessária arrecadação de recursos financeiros.

Para ajudar a manter vivo o legado de amor e serviço de Santa Dulce, é possível fazer doações em prol das Obras Sociais Irmã Dulce através do PIX: amigos@irmadulce.org.br; ou pelo site da campanha Um Milhão de Amigos para Santa Dulce:  www.1milhaodeamigossantadulce.org.br; ou ainda ligando para a Central de Relacionamento com o Doador, no telefone (71) 3316-8899, de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h30.

A campanha conta com o apoio totalmente voluntário de uma agência parceira e de artistas embaixadores, dentre os quais o cantor Roberto Carlos, que cedeu o direito autoral da música Eu Quero Apenas.

A OSID mantém também o programa Sócio-Protetor, uma das mais importantes fontes de recursos da instituição. Através do site www.irmadulce.org.br/socioprotetor é possível obter mais informações e se cadastrar no programa de fidelização. Qualquer pessoa física e/ou jurídica pode se tornar um Sócio-Protetor, contribuindo através de boleto bancário ou de débito em contas de alguns bancos.

Papa Francisco: nas intenções de dezembro, um chamado ao voluntariado

 

Em sua 12ª edição de 2022, o Vídeo do Papa destaca as organizações de voluntariado (e todas as pessoas nelas envolvidas), atores-chave na sociedade devido ao seu empenho na promoção humana e no bem comum. O Santo Padre exorta os voluntários a atuarem "não só para as pessoas, mas com as pessoas", sendo "artesãos da misericórdia" e sabendo sempre escutar as necessidades dos outros.

O Papa Francisco pede ainda que se reze "para que as organizações voluntárias e de promoção humana possam encontrar pessoas dispostas a empenhar-se no bem comum e a procurar novas formas de colaboração a nível internacional". Segundo o programa Voluntários das Nações Unidas (UNV), 1 em cada 9 pessoas no mundo faz trabalho voluntário, sendo, no total, 862,4 milhões de voluntários nos cinco continentes.

Com a soma de todas as horas de voluntariado, resultaria em 109 milhões de empregados a tempo integral. Observa-se, porém, que "a maioria do trabalho de voluntariado a nível mundial realiza-se informalmente", fator que dificulta a precisão das estatísticas sobre o impacto que se tem nas comunidades.